Administradores e gerentes têm de pagar coimas fiscais das empresas



Tribunal Constitucional contraria entendimento do Supremo Tribunal Administrativo

A Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) pode continuar a exigir aos administradores e gerentes o pagamento das coimas aplicadas às empresas que estes dirigiam sempre que estas se encontrem falidas e sem meios para pagar as referidas coimas. A decisão é do Tribunal Constitucional que, num acórdão de 12 de Março, contraria uma decisão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) que considerava esta actuação inconstitucional.Na prática, sempre que uma empresa era penalizada com uma coima por falta de pagamento de impostos ou de entrega de declarações, a DGCI, quando tentava efectuar a cobrança, deparava-se com situações em que a empresa já estava falida e sem bens que permitissem saldar a dívida. Para garantir que a coima era paga, a administração fiscal revertia a responsabilidade pelo seu pagamento para os administradores ou gerentes da empresa. E fazia-o com base em normas previstas no Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), em concreto, nas alíneas a) e b) do artigo 8.º. Segundo estas normas, os administradores e gerentes são responsáveis pelo pagamento das multas ou coimas das suas empresas em duas situações: "por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento"; e "por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento".Inconstitucional, diz o STAPerante as normas previstas no RGIT e a actuação do fisco, os administradores e gestores, quando confrontados com estas coimas, começaram a recorrer para os tribunais alegando que estas normas contrariavam a Constituição. Face a estas contestações, em vários acórdãos do ano passado, o STA considerou que as normas do RGIT em que a DGCI se baseava para aplicar as coimas aos administradores e gerentes eram inconstitucionais por violarem o número 3 do artigo 30.º e o número 2 do artigo 32.º da Constituição. Ou seja, contrariavam as normas que estabelecem que "a responsabilidade penal é insusceptível de transmissão" e que "todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa".O Tribunal Constitucional tem, no entanto, um entendimento diferente, defendendo que nestes casos "o que está em causa não é (...) a mera transmissão de uma responsabilidade contra-ordenacional que era originariamente imputável à sociedade ou pessoa colectiva". Ou seja, no acórdão do passado dia 12, cinco juízes do Constitucional argumentam que o que está em causa é "a imposição de um dever indemnizatório que deriva de facto ilícito e culposo que é praticado pelo administrador ou gerente, e que constitui causa adequada do dano que resulta, para a administração fiscal, da não obtenção da receita em que se traduzia o pagamento da multa ou coima que eram devidas". A aplicação de coimas pelo fisco não tem parado de crescer ao longo dos anos. No relatório sobre o combate à fraude e evasão fiscal, as Finanças dão conta de que em 2008 foram cobrados 238 milhões de euros. Em 2003, esse valor era de apenas 38 milhões. As Finanças realçam ainda que o objectivo para 2008 era de uma cobrança de 180 milhões de euros. a Um novo retrocesso nos direitos e garantias dos contribuintes e uma decisão que deixa os administradores e gerentes sem meios de defesa. É desta forma que os fiscalistas Rogério Fernandes Ferreira e Pedro Amorim comentam o acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que permite ao fisco exigir aos administradores e gerentes de empresas coimas cuja responsabilidade é da própria empresa e não deles.Para Rogério Fernandes Ferreira, antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no segundo governo de António Guterres, "não parece poder ser dada razão ao TC. Porque o que está em causa é o chamamento de terceiros (administradores e gerentes) a responder pelas dívidas de outrem". Segundo o fiscalista, "não está em causa um qualquer processo autónomo em que seja apreciada a culpa do terceiro administrador ou gerente, mas, tão-somente, um processo em que se imputam automaticamente as dívidas a este administrador e gerente". Ou seja, conclui Rogério Fernandes Ferreira, "este acórdão representa novo retrocesso nos direitos e garantias dos contribuintes, e da certeza e da segurança jurídicas, permitindo, pela primeira vez, que um terceiro (o administrador ou gerente) possa vir a cumprir a pena em que outro foi condenado".Também o fiscalista Pedro Amorim discorda da interpretação dos juízes do Constitucional, salientando que lhe causa "várias perplexidades". Desde logo, porque não se percebe a razão para inverter toda a jurisprudência anterior, depois, por não se perceber porque é que o Constitucional "entende que as contra-ordenações (punidas com coimas) devem ser mais tuteladas que os crimes (punidos com multas). É que, se estivermos perante um crime fiscal (por exemplo a fraude fiscal), a pena aplicada à empresa (multa) não é transmissível para os gerentes". Pedro Amorim salienta ainda que esta decisão irá levar "a que qualquer gerente possa ver a sua situação patrimonial seriamente afectada muito antes de se poder defender", ou seja, antes de poder demonstrar que não teve culpa na insuficiência patrimonial da empresa que esteve na origem do incumprimento das obrigações fiscais.
(Jornal Publico 23.03.2009 - 08h38 Por Vítor Costa)

Comments

Anonymous said…
Então interessante este site está bem organizado.........boa:)
Muito Bonito faz mais posts deste modo !